Poder: um desejo necessário e uma repulsa a ser trabalhada

Querer e perseguir poder é algo louvável, ou deveria ser. A capacidade de realizar mudanças exige patrocínio, e isso não temos nenhum problema em reconhecer e perseguir: queremos que nossos movimentos sejam patrocinados por nossos líderes poderosos. Perseguir poder, por outro lado, nos remete à um aspecto menos nobre ou até a um lugar que não deveria ser desejado.

Já fazem mais de 5 anos desde que li pela primeira vez o autor Jeffrey Pfeffer[i]. Reconheci a importância do tema, mas confesso que ainda é algo que não está plenamente introjetado em minhas crenças. Li o novo livro dele lançado em junho de 2022, 7 Rules of Power, uma versão mais didática e enfática da importância de termos atitudes atentas para criamos e mantermos poder.

Desprezar as regras do poder é uma grande barreira para carreira de qualquer profissional. O que torna essa reflexão tão essencial.

“People come not only to recognize what they need to do to change lives, organizations, and the world, they understand that they only have the choice of leaning into the rules of power and using them, or opting out, with all that the idea of opting out implies.”

O primeiro passo para entender o que nos afasta de querer poder é um olhar para nossa identidade: não somos vilões.

Quem quer poder são vilões. Essa é uma definição implícita por anos de storytelling de filmes e desenhos de heróis. O desejo pelo poder nunca está associado aos heróis, ao contrário, muitas vezes eles nem queriam o poder que ganharam.

Respire e faça sua reflexão sobre isso: o Super Homem não quis poder, já seu vilão… e se olharmos Harry Potter, o bruxo que quer poder é novamente o vilão. Homem-Aranha custou a reconhecer a responsabilidade que vem com seus poderes, a lição moral inclusive não é da importância do poder, mas dessa carga de responsabilidade. Pode continuar pensando aí, X-Men, quem quer poder Xavier ou Magneto? Batman nasceu poderoso, desprezou tal poder, já seus vilões são ávidos pelo poder. Vamos no nosso super herói raiz: Esqueleto vs He-Man: quem quer poder?

Não é à toa que por mais que reconheçamos a importância de ter poder, não temos o modelo mental de querer o poder. Afinal nos moldamos inspirados pelos heróis e não queremos nos associar aos vilões.  

Do mundo Marvel, Disney ou qualquer que seja nossa influência, precisamos abstrair para realidade de nossa carreira: os ambientes corporativos. As nuances de vilões e heróis podem até existir, mas deixam de fazer sentido. A batalha é no campo das ideias e geração de valor: realizar as transformações que queremos ver no mundo. Tais transformações precisam ter o devido financiamento, patrocínio, engajamento de pessoas, e eis que tudo isso remete ao jogo do poder.

No mundo corporativo existem ideias boas e ruins. Pessoas com propósitos mais nobres do que outras. Podemos até estereotipar pessoas bem intencionadas ou mal intencionados na condução dos negócios. Como bem coloca o autor, e nesse sentido, o primeiro pilar envolve reconhecer: se o poder é importante para as pessoas boas fazerem as coisas boas, mais pessoas boas precisam de poder.

“(…) if power is to be used for good, more good people need power.”

“Change requires power. If change were going to happen without power and influence, it would have already”

Uma vez que reconhecemos a importância do poder, vale entender como obtê-lo.

O livro cumpre dois objetivos: (1) reconhecer a importância de perseguir poder e (2) criar estratégias para ganhar poder. Espero inspirar a leitura do livro e, por isso, não vou aqui enumerar as sete regras.

O caminho de obtenção de poder começa por reconhecer e trabalhar nossa identidade para almejá-lo e esse me parece o maior dos desafios. Nos auto boicotamos na jornada de trilhar o poder. Uma das reflexões inspirada na leitura das formas de nos boicotar é o exercício do julgamento.

“judgment is a source of unhappiness and discontent, because in comparing what is with what we think should be, the almost inevitable observed discrepancies lead to frustration and negative affect.”

“Mother Teresa famously said, ‘If you judge people, you have no time to love them.’”

Para ter poder precisamos nos aproximar das pessoas, e não ficar criando várias barreiras de julgamento. Precisamos mesmo ficar julgando, criando pré-julgamentos e seus conceitos derivados? A inveja e a mentalidade pequena, egóica, muitas vezes recorre ao julgamento e nos boicota de focar naquilo que agrega poder para nossas vidas.

“(…) social relationships matter for getting things done, in organizations or in society more broadly.”

Precisamos de poder para fazer.

Parte desse poder é a arte de relacionar mesmo com pessoas das quais você não gosta, ser menos sentimental sem perder sua identidade. Eis um belo desafio de maturidade: entender quais batalhas entrar.

O poder atrai, logo existe um ciclo virtuoso em torno do ter poder. Saber quebrar as regras, saber usar o poder, são regras exploradas pelo autor que merecem nossa atenção de como criar um circulo virtuoso do poder para nossa carreira.

“The more connections you make, the more people come to see you as a well-connected (translation: powerful) individual. Thus, helping others builds your own reputation even as it provides a service of real value—the very definition of win-win.”

“the more someone uses their power to get things done—including structuring the world around them and changing who works with and for them in ways that support themselves and their objectives—the more power they will have.”

“when you are powerful and successful, you will have more friends than you ever knew you had; when you lose power, no one will know you.”

Entregar, dizer que entregou, ser reconhecido pela entrega: imagem é tão importante quanto resultado.

Muitos técnicos e especialistas extremante talentosos se ressentem por não serem ouvidos: estão errando no jogo do poder. Achar que a competição no mundo corporativo é apenas focada em resultados é uma ilusão. Imagem e saber contar a história é tão importante quanto entregar e realizar.

Uma vez mais temos um universo imagético que nos afasta do desejo do poder. Várias histórias épicas de fraudes corporativas mostram a liderança poderosa sem virtuosidade. É o uso extremo da imagem sem resultados que não se sustenta. Com isso associamos, uma vez mais, ter poder com mau caráter.

Não podemos alimentar essa associação que nos afasta de querer poder. Pense nesses casos com a falta de poder na mão de pessoas bem intencionadas, para além da coragem de enfrentar e não ter “omissões bem remuneradas” nos executivos que cercam os poderosos. O retrato de jogo de poder mal jogado por executivos que viram cumplices omissos.

“is about acknowledging and accepting who you are but not letting that identity define who you will be forever. It is about understanding the importance of social connection but not letting the need for acceptance overwhelm what you want to get done, and the necessity of pursuing your own interests and agenda. It is, in short, about getting out of your own way and getting on with the task of building the power base that will provide you the leverage to accomplish your goals.”

Como vai trilhar seu caminho de poder?

A pergunta é uma provocação final para você se inspirar e encarar essa agenda do poder. Comece pela leitura do livro, seja esse ou edições outra do autor. Vale conhecer o podcast dele também: https://pfefferonpower.podbean.com/

O autor faz uma recomendação de coach que gosto muito. Ter pessoas para te ajudar na sua jornada de ganhar poder.

“find a coach who will nicely, constructively, but firmly push you outside of your comfort zone, and get you to think hard about your choices and your actions—the only things over which you have control—so you can prevail in power struggles”

Entenda e crie seu caminho, com suas próprias reflexões. Como grande fã do tema vulnerabilidade, bandeira da autora Brené Brown, confesso que vejo alguns paradoxos entre os dois autores, mas que não parecem ser intransponíveis, seria um debate de qualidade.

“So, yes, you can express vulnerabilities and insecurities among friends, or when you hold a position in which you are not a leader. But in high-status and task-relevant positions, you are much better off keeping any insecurities to yourself. People want to be aligned with someone who they think is going to win, to prevail, so doing anything that disabuses them of that belief is probably a mistake.”

P.S: todas as citações do livro 7 rules of Power

[i]Para ver a primeira reflexão que escrevi sobre o autor: https://reflexaogestao.com.br/reflexoes/como-tornar-o-jogo-do-poder-divertido.html

Avaliação